sexta-feira, 15 de maio de 2009

Ciclo sem fim.

Lembro-me de tudo. Lembro-me de como tudo começou, de cada abraço dado, de cada sorriso esboçado, de cada segredo, de cada promessa, das horas que passávamos a fio a conversar sem nunca nos cansarmos. Contigo tudo ocorre como na primeira vez. Não faço ideia há quanto tempo te conheço e não estou preocupada com contas, estimativas médias ou debates, simplesmente não me interessa. Mas há um episódio que nunca esquecerei, quando te conheci! Foste com quem eu troquei o meu primeiro olhar quando entrei pela primeira vez numa sala de aula. Com um gesto amigável acenaste-me e esboçando um largo sorriso dizes-me pela primeira vez: “Olá!”. Eu corei e tu vendo-me atrapalhada soltas-te um riso e perguntaste-me se não queria ser tua colega de carteira. Eu acenei com a cabeça e fui na tua direcção. E amo-te desde esse momento. Antes que saísse para o intervalo, metes-te conversa comigo. As perguntas eram engraçadas: “Gostas de brincar ao quê?” “Gostas de ver o Panda?” “gostas de saltar à corda?” e foi assim que descobrimos que éramos quase, alma gémeas. Passámos o intervalo a brincar na sombra da grande árvore que cobria quase por completo o lugar que em breve se tornaria no nosso “cantinho”. Disseste-me que gostavas de ser pintora. Estávamos prestes a ir embora quando tu paras no meio do caminho e me perguntas: “Olha, queres ser a minha melhor amiga?”. “Está bem” respondi. O intervalo chegava ao fim e fomos a brincar à apanhada até à sala. Na aula a professora perguntou o que naquele momento estávamos a gostar mais na escola nova. A maioria respondeu o espaço anglo do recreio, outros as auxiliares, uns até mesmo a comida. Mas tu tinhas de ser diferente, e ao chegar a tua vez respondeste com um tom sereno “gosto da nova escola pois acabei de encontrar a minha nova melhor amiga”. E olhamos uma para a outra em simultâneo. A aula acabou momentos mais tarde mas ainda tínhamos a tarde inteira para brincar. Almoçámos à pressa para ir lá para fora. E passou tão depressa. Brincadeiras como jogar à macaca, à caça ao tesouro, às escondidas até mesmo a desenhar e a ler histórias da “Rua sésamo” enchiam-nos por completo a tarde e quando dávamos conta era naquilo que tínhamos passado quase todo o dia. Dias mais tardes é que soubemos a idade, o nome do pai e da mãe e o nome completo uma da outra. Porque não nos interessava naquela altura. Queríamos brincar, correr, rir, dar quedas, limpar feridas, trabalhar manualmente em conjunto. Para nós aquilo chegava e sobrava. Não nos interessavam os rapazes, a música, os mistérios da vida ou mesmo a última moda. Tudo aquilo era o nosso mundo, e nos gostávamos dele. Não conhecíamos mais nada para além das grades verdes que nos separavam do exterior. Foram os anos mais inocentes que passámos juntas. A infância. E é desde aí que te conheço. Lembro-me do dia em que abandonamos para sempre aquele lugar que nós considerávamos a nossa segunda casa. Por tempos pensei que nunca mais te veria pois dizias que querias ir para outra escola, mais perto da tua casa do que aquela com que nós sonhávamos entrar juntas de mão dada pela primeira vez. E não é que acabamos mesmo por realizar esse nosso sonho de infância? Era um mundo novo, completamente diferente do que aquele que nos tínhamos habituado, completamente diferente daquilo que já tínhamos imaginado. Entramos e saímos de mão dada daquela escola. Fizemos amigos novos, que juramos ser para toda a vida e é verdade que ainda mantemos alguns. Sempre me lembro de ti como “melhor amiga”. E o que mais gostava naquela altura era que te tinhas mudado para o meu prédio e íamos todos os dias juntas para a escola. Foi atrás do pavilhão que me contaste que pela primeira vez estavas apaixonada por alguém. Aquilo para nós era um sentimento desconhecido, algo completamente novo! Começava também a notar que olhávamos os rapazes com outros olhos. Já não eram aquelas criaturas ascorosas e nojentas que só sabiam reproduzir ranho e gozar connosco. Não. Sentíamos o coração a bater depressa quando eles vinham falar connosco, um leve arrepio a percorrer-nos a espinha e um nó na garganta. Sentíamos saudades deles quando não estavam ao pé de nós. E começávamos a gostar da atenção e das brincadeiras parvas que eles nos faziam. Começava o nosso primeiro contacto com o amor. E para nós tudo aquilo era um conto de fadas da Cinderela projectado para o Mundo real. “Ontem” estávamos as duas a desenhar casinhas e a brincar às barbies e “hoje” estávamos ali, a abrir pela primeira vez uma enciclopédia que nos explicava tudo acerca do Mundo do sexo. Folheávamos as páginas e riamo-nos das imagens que apareciam. Aprendíamos as primeiras bases daquele assunto. Ouvíamos os outros rir e para não parecer mal riamo-nos também, pela primeira vez preocupava-nos o que os outros pensavam de nós. Foi nesse novo modelo de vida que aprendemos que brincar às barbies e desenhar casinhas e bonecas era ridículo. Que devíamos estar na moda para sermos aceites num grupo melhor. Que não tínhamos hipóteses com os rapazes mais velhos porque eles todos nos achavam umas criancinhas sem remédio. Mas em breve descobriríamos que esses assuntos não passavam de tontices, porque houve outro “alguém” que nos explicou. Foi mais ou menos e meio do ano que nos apareceu a primeira borbulha. Entramos em pânico, que “doença” era aquela?! Notámos que quase todos os miúdos e miúdas da nossa idade estavam “doentes”. Empastados daqueles altinhos cor-de-rosa com a ponta verde que se sobressaiam da nossa cara à distancia. E foi em tua casa, ouvindo os primeiros conselhos da tua mãe que aprendemos que as borbulhas eram algo normal na nossa idade e que se apanhássemos sol e usássemos os cremes certos elas desapareceriam. Disse-nos também que as borbulhas só demonstravam que estávamos a crescer e não deveríamos sentir vergonha por isso. Ora. Sabíamos lá nós, que a nossa cara e as nossas costas se empastariam delas! Calma estávamos a crescer, mas começávamos a ter vergonha pela primeira vez de usar tops e mostrar a pele. Tínhamos receio que alguém gozasse connosco e só as nossas colegas sabiam daquilo. Nos corredores olhávamos para o corpo das raparigas mais velhas e sentíamos inveja por não nos considerarmos “boas” como os rapazes diziam. Começávamos pela primeira vez a odiar o nosso corpo e a desejar mais. Queixávamo-nos de tudo e até nem tínhamos o corpo mal feito. Era o que achávamos naquela altura. Umas queixavam-se da gordura mas nós estávamos excessivamente magras. Notávamos também que a maioria delas tinha os lábios, os olhos, as unhas, tudo pintado! Não era suposto serem os palhaços a pintarem-se? Achamos ridículo mas os rapazes pareciam gostar, toda a gente parecia gostar! Quando demos por nós, estávamos na casa de banho da minha casa a pintar pela primeira vez, mal e porcamente as unhas. Aprendemos a distinguir pela primeira vez, as bases, os cremes, os batons. Tu até tinhas jeito para a coisa. O talento que tinhas para pintar favorecia-te imenso, em quase tudo. E foi ao acaso que descobrimos que a base disfarçava bem as borbulhas e as manchas. Estávamos parecidas pela primeira vez, às raparigas da televisão. Encharcávamo-nos em maquilhagem mas se reparássemos bem, as pessoas experientes naquilo, faziam-no discretamente (pelo menos aquelas que andavam connosco na escola). A partir daí começamo-nos e maquilhar todas as manhãs antes de ir para a escola. As pessoas começavam-nos a olhar com outros olhos, até as raparigas mais velhas falavam connosco. Não durou muito tempo até nos fartamos daquela máscara, porque houve alguém que nos ensinou que a beleza era muito mais bonita ao natural, e não era com vernizes e batons que íamos disfarçar os nossos verdadeiros podres. A partir de aí largamos a maquilhagem e aprendemos a gostar pela primeira vez como éramos. Todos naquela altura ouviam rap e musica pop e nós também entramos na onda. Estavas comigo quando colei pela primeira vez um poster no meu quarto. Estávamos ambas orgulhosas e achávamo-nos fixes por ouvir o tipo de música que naquela altura se ouvia. Gostámos desse tipo de música durante mais de um ano. O que estava na moda naquela altura eram as calças largas os fios de ouro e os bonés de lado. Nos queríamos ser como eles, mas houve alguém que não nos deixou e que nos explicou que aquela moda era passageira e que seria um desperdício gastar dinheiro em coisas que passado tempos não mais voltaríamos a usar. E foi pela primeira vez que deixamos de ser obcecadas com a moda. Fizeste uma festa quando te mostrei pela primeira vez o meu telemóvel e foi contigo que troquei as primeiras mensagens. Ainda não estávamos habituadas aquele novo instrumento e ao trocar mensagens com outras raparigas da nossa idade reparávamos pela primeira vez que a maneira como elas escreviam era diferente da nossa. Usavam os x’s os k’s os u’s em vez dos o’s e abreviavam palavras extensas que demoravam horas a escrever. Usavam expressões estranhas que nós rapidamente nos acostumamos a usar. Escrevíamos como elas e achávamos um máximo. O que estava na moda naquela altura era a chamada conta do hi5 e a do e-mail que nós desconhecíamos. Criamos juntas as nossas primeiras contas do hi5 e do e-mail. Era um mundo completamente desconhecido para nós. Ambas rapidamente descobrimos como aquilo funcionava e nas tardes livres que passávamos juntas preocupava-nos mais tirar fotos e coloca-las na nossa conta do que propriamente estudar. Passávamos horas a fio naquilo sem nos cansarmos. As nossas notas começavam a descer a pique. E vieram os castigos pela primeira vez. Achámos uma seca mas por mais que nos custe admitir tinham razão ao castigar-nos. Mas levou muito tempo até percebemos que devíamos ter a chamada vida própria e não viver em função da internet porque alguém nos explicou que não devia ser assim.Começaram a entrar no nosso mundo feminino os rapazes, pela primeira vez. Estávamos ambas “apaixonadas” e passávamos horas a fio a falar sobre os novos progressos porque o que nós queríamos mesmo era alcançar um namorado! Porque esse era um dos nossos velhos sonhos. Invejávamos as raparigas que se enrolavam com beijos e abraços com os namorados. O namorado era aquela pessoa que dava voltas na escola de mão dada connosco. O namorado era a nossa alma gémea. Deveria ser fantástico arranjar um namorado. Era essa a ideia que tínhamos sobre namoros. Durariam para sempre, nem nada nem ninguém o poderia estragar. Eles estariam sempre à nossa disposição e nunca discutiam connosco. Começávamos a gostar dos rapazes da nossa turma. Eram mais “alcançáveis” e pareciam gostar de nós. Começavam as primeiras intrigas. Contávamos a varias pessoas de quem gostávamos tendo confiança em quase todas as pessoas. Mas a notícia rapidamente se espalhou. Mas era mais que óbvio que parecíamos ser correspondidas com os nossos primeiros apaixonados. Tu mais do que eu. E pela primeira vez me disseste: já dei um beijo na boca! E eu nesse momento invejei-te. Estavas super contente e eu claro que também estava. Pensávamos as duas que a partir daquele dia ias ter um namorado, já tinham dado um beijo, estariam casados para o resto da vida. E lembro-me de que dias mais tarde me teres vindo abraçar com tristeza. Parece que afinal não estavas casada durante toda a vida. Tinhas sido enganada por um rapaz, que o único que queria era uns beijinhos, como as raparigas da novela! E foi assim que pela primeira vez descobríamos sozinhas que os rapazes eram uns porcos e jurámos viver uma para a outra sem pensar em namoros. Os amigos começavam a ser pela primeira vez o mais importante. E assim começavam as primeiras saídas, as primeiras idas ao cinema, ao parque, os almoços e as voltas pela escola. Aprendíamos a estar pela primeira vez em grupo, com rapazes e raparigas, distribuindo atenção por todos e olhando todos da mesma maneira. Aprendiamos a escrever decentemente e a esquecer as abreviaturas. Aprendíamos a falar sem usar expressões do calão. Aprendíamos a confiar nas pessoas certas e a não contar tudo aos nossos pais. Aprendíamos a apreciar rapazes sem nos apaixonarmos. Aprendíamos que andar aos beijinhos com rapazes não era sinal de namorar. Aprendíamos a ter as primeiras conversas normais sobre sexo e que isso afinal não era nenhum bicho-de-sete-cabeças. Aprendiam aos a ser liberais e a tratar os assuntos como deve de ser. Dávamo-nos com as pessoas certas. Conseguíamos tirar duvidas sobre tudo e a não ter vergonha de nada. Éramos chamadas de adolescentes pela primeira vez.E dias mais tarde aparece-nos o período pela primeira vez. Como tinhas o corpo mais desenvolvido que o meu, foste tu a primeira vítima. E fizemos um drama a pensar que estavas a sangrar porque em breve morrerias. E não contamos às nossas mães com vergonha. Pela primeira vez escondíamos-lhes algo pois preferíamos esclarecer-nos com gente da nossa idade e assim o fizemos. Aprendemos tudo o que sabemos hoje. É graças uma à outra que somos aquilo que somos. Lembro-me de quando ouvimos rock pela primeira vez, de te ter mostrado e de tu teres odiado, porque estavas numa de kisomba. Pela primeira vez não concordávamos uma com a outra. Foi rápido ate te habituares ao “barulho” que ouvias. Já estavas a ficar mais obcecada do que eu! Estávamos a ouvir juntas pela primeira vez música a sério. Tornamo-nos numas roqueiras sem emenda e pela primeira vez fomos a um concerto (ao do avante xD) com o grupo de amigos. Foste a primeira pessoa a ler o meu primeiro texto. Adoraste-o. E ambas começamos a ocupar o nosso tempo livre, a dar luz a textos lindos que nos metiam ambas a chorar. Também líamos muito. Tu pintavas e eu ficava contemplada a olhar o teu momento de magia. Lembraste quando representei para ti a primeira vez? Disseste “parece que ambas vamos ser famosas, com saída no mundo das artes. Tu actriz e eu pintura. Que tal?” e fizeste uma expressão orgulhosa. Dias mais tarde entrámos juntas pela primeira vez numa escola de guitarra. E púnhamos as nossas mãos pela primeira vez naquele instrumento e reproduzíamos música pela primeira vez. Eu tinha mais jeito para a coisa e tu apaixonaste-te pelo nosso professor. Nunca discutimos, não me lembro a sério e acho que eram zangas parvas quando éramos pequenas. Mas nunca resistíamos muito tempo porque neste momento fazes parte de mim.Este é o nosso passado. O nosso presente e o nosso futuro. Esta é a nossa história que merece ser contada vezes e vezes sem conta. Isto sou eu e tu. Nós. Hoje, amanhã, para todo o sempre. És o meu sorriso, as minhas lágrimas, o sangue que me corre nas veias e o ar que respiro. És-me tudo. Vou dize-lo uma vez, e espero que o agarres bem, que o metas na cabeça e que nunca mais os esqueças.

Amo-te . Tudo isto é o nosso ciclo. O nosso ciclo sem fim (L'


(Dedicado à minha melhor amiga. Que supostamente nao existe )

2 comentários:

  1. Adorei este texto Bia.
    Tornaste-te numa menina extraordinária hein?

    [li a sorrir.. :p que eu não canto lá muito bem ahahah]

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  2. Que texto Fernandes! :OO
    Sabias que tinhas muito jeito? e_____e
    Sabias que tens tanto jeito para tanta coisa que chegas a ser um idolo para mim? e.e
    Sim! :O
    Uma pessoa tao parva, tao estupida, tao 'imatura' como tu chega a ser um idolo para uma pessoa tao anormal como eu! OO'
    A Fernandes e um dos meus idolos :DD
    Amo.te 2 melhor amiga/Idolo/Joel/Esticadinha/Companheira De Coisas que so nos sabems e temos coragem para fazer (:
    Eu quero.te para sempre (isto nao existe mas whatever), pode ser? :3

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