Sempre Carnaval

Estávamos na altura do carnaval quando eu decidi comprar uma máscara. Percorri mil e uma lojas e não encontrei nenhuma que gostasse.Na véspera do baile de carnaval, enquanto passeava nos arredores da minha cidade, pareceu-me ouvir alguém chamar: “menina, por favor…”. Virei-me. Era uma senhora idosa um pouco mal vestida e de cabelos brancos. Pediu-me dinheiro e prometeu-me que em troca me oferecia uma coisa. Dei-lhe o que me tinha pedido e a senhora, passou-me para a mão uma máscara de carnaval. Feita à mão, uma verdadeira réplica dos carnavais em Veneza. Uns olhos grandes e risonhos, um sorriso alegre e maroto, um degradê perfeito cheio e cheio de cor, que me tornaram na noite do baile uma estrela. Eu que sempre fui calada e um pouco tímida começava a perceber que ao contar piadas e estando sempre, sempre a sorrir, as pessoas que mais queríamos, aproximavam-se de nós.
E assim fui crescendo, sempre construindo esta máscara que me faz hoje em dia, completamente dependente dela. Por mais que a queira tirar, não consigo. Para mim todos os dias são um longo e trágico desfile de Carnaval.Eu tenho uma máscara. Não daquelas coloridas, de plástico ou feitas à mão. Ela existe. Mas ninguém a vê porque é facilmente confundida com a realidade.
Com essa máscara eu consigo mostrar ao mundo o meu lado mais superficial. Consigo ao ponto de (algumas) pessoas se afastarem de mim, por pensarem que eu sou desvairada, oca, hiper-extrovertida, faladora e FÚTIL. E consigo que algumas se aproximem por me acharem graça. Rir, brincar, avacalhar, é só isso que pensam que sei fazer.
Vou chamar a esse meu lado, Bia A. Assim é mais fácil. A Bia A ri dos problemas e não os resolve. A Bia A. também ri se gozam com ela ou se alguém fala mal nas suas costas. A Bia A. ainda se ri sozinha. A Bia A. nunca se cala. A Bia A adora, não, ama, ser o centro das atenções, gosta (ama) ser elogiada (embora diga que não, para parecer boazinha). A Bia A odeia (não suporta) ser criticada e corrigida, porque para si, ela é perfeita. A Bia A é egocêntrica e empina o nariz sempre que as coisas não correm como ela quer, ainda faz birras. A Bia A adora ter azia para os rapazes se meterem com ela. A Bia A faz figuras ridículas e não se importa com o que os outros dizem dela (a Bia A é uma rebelde). Para a Bia A, passado, é passado. A Bia A diz coisas sem sentido só para ter piada. A Bia A adora roupa, sapatos e rapazes e tem uma personalidade forte. A Bia A é superficial e é com ela que eu me mascaro todos os dias.
E por detrás dessa máscara está alguém melancólico, sério e muito inseguro. A Bia B. Ela é tímida e odeia ser elogiada e ter gente a olhar para ela. É sensível e é capaz de chorar se não estiver com ninguém. A Bia B é discreta e quase ninguém dá por ela. É medricas e tem medo de tudo. Preocupa-se com o que os outros pensam dela e não gosta de fazer má figura nem dar má impressão. A Bia B é calada, reservada e é uma pessoa fraca. Ela não ri, porque não tem motivos para isso. Adora pensar, escrever e estar sozinha. Para ela, musica é mais interessante que rapazes. Liga ao interior das pessoas. Ela que sempre existiu, transformou-se numa sombra da Bia A.
Eis um lado que quase ninguém conhece porque se o mostrasse a muita gente que julga conhecer-me não me levaria a sério, por isso só desabafo com certas pessoas, e as mais velhas são as melhores. É mais fácil mostrar ao mundo o meu lado superficial e mesmo não querendo é o que eu faço. Repreendo-me a mim própria mas quando dou por mim, lá estou eu a ter piada mais outra vez. Mas eu não gosto. Era bom se as pessoas não se relembrassem de mim como “a maluca” ou a “engraçada”. Era pedir demasiado a mim mesma. Ser uma só pessoa, perfeita ou não, mas uma só. Sem divisões nem confusões, sem A’s nem B’s.. Apenas eu. Ai… ai… onde estás tu personalidade? Ora vens, ora te vais! Ora me encho, ora me esvazio! Onde estás tu Bia?
O carnaval já passou há muito tempo…

Tua: Bia (Sem A’s nem B’s)